
O precioso livro Wahrhaftige Historia, escrito por Hans Staden, sobre as duas viagens que realizou ao Brasil entre os anos de 1548 e 1555.
Quatrocentos e cinqüenta anos depois de sua primeira edição, o livro permanece um dos mais curiosos documentos sobre a cultura dos índios brasileiros, especialmente os tupinambás, que aprisionaram o navegante e mercenário alemão e quase o devoraram em seus rituais canibalescos.
O relato de Hans Staden (1525–1579) está para os alemães assim como a carta de Pero Vaz de Caminha para os reis de Portugal. Em Verdadeira História dos Selvagens, Nus eDevoradores de Homens, Encontrados no Novo Mundo, A América, a reportagem feita por Staden é a descrição de um homem simples, de forte fervor religioso, sobre a natureza e a paisagem do Brasil e os costumes de seus habitantes. Uma aventura onde se revelam também as questionáveis formas de colonização empregadas pelos europeus na conquista de outros continentes e o inevitável choque cultural entre os chamados "selvagens" e "civilizados".
Segundo a edição Brasiliana da Biblioteca Nacional, de 2001, o livro de Staden foi determinante para os europeus: "A sua influência no meio culto da época ajudou a criar, no imaginário europeu quinhentista, a idéia da terra brasílica como o país dos canibais, devido às ilustrações com cenas de antropofagia". Monteiro Lobato foi taxativo, ao estimar o valor dos escritos do autor alemão: "É obra que devia entrar nas escolas, pois nenhuma dará melhor aos meninos a sensação da terra que foi o Brasil em seus primórdios".
Em suas próprias palavras, Staden não pretendia se vangloriar de suas experiências junto a um povo tão exótico para ele. "O porquê de ter escrito este livrinho foi enfatizado por mim em diversos trechos. Todos nós devemos louvar e agradecer a Deus por ter-nos protegido desde o nascimento até os dias de hoje, ao longo de uma vida inteira. Assim como os portugueses, franceses, espanhóis e holandeses, os alemães também participaram da exploração do Brasil no início do século 16. Minha primeira viagem para a América foi em uma nau portuguesa. Éramos três alemães a bordo, Heinrich Brant von Bremen, Hans von Bruchhausen e eu. A segunda viagem ia de Sevilha, na Espanha, para o Rio de La Plata", conta o autor, que na segunda expedição era o único alemão presente. "Acabamos sofrendo um naufrágio em São Vicente. Trata-se de uma ilha que fica bem próxima à terra firme brasileira e é habitada por portugueses."
O livro revisitado
Os nove meses em que Hans Staden ficou em poder dos tupinambás renderam um relato impressionante em nível antropológico, sociológico, lingüístico e cultural que é constantemente revisitado. O livro, que é considerado um sucesso editorial, já inspirou montagens teatrais pelo mundo afora, semeando a imaginação dos modernistas Raul Bopp e Oswald de Andrade na criação da Revista de Antropofagia, de 1928, onde foi publicado o substancial Manifesto Antropofágico, de Oswald: "Perguntei a um homem o que era o Direito. Ele me respondeu que era a garantia do exercício da possibilidade. Esse homem chamava-se Galli Mathias. Comi-o".
Cartaz do filme 'Hans Staden'
Cartaz do filme 'Hans Staden'A aventura de Hans Staden acabou sendo levada às telas pelas mãos do cineasta brasileiro Luiz Alberto Pereira em Hans Staden, um dos poucos filmes na história do cinema em que a língua falada pelos atores é, predominantemente, a tupi, e que conquistou diversos prêmios no Brasil e nos Estados Unidos.
O livro ganhou em 1998 uma primorosa edição da Dantes Editora e Livraria, do Rio de Janeiro, em tradução de Pedro Süssekind, que traz, além das ilustrações originais, desenhos e gravuras de Theodoro de Bry, Roque Gameiro, Van Stolk, entre outros.
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