O Louco de Montevideo
Com o dia mais bonito, mais sol e menos frio, pude conhecer outras partes da cidade, que se me afigura mais interessante. Ando pelas ruas da cidade velha, tiro fotos e converso com as pessoas. Aos poucos vou me inteirando da vida no Uruguay. Coitados, como estão ferrados com os políticos. E eles pensam que o Lula é um grande presidente, uh! Os problemas são os mesmos, mesmíssimos: a mesma submissão ao FMI, a desvalorização do trabalho, a corrupção e a especulação financeira.
Sabe aquelas cenas de rua que fazem as delícias de um flaneur? Isso é em francês o termo elegante para desocupado passeando. Pois a tal cena foi a de um senhor desequilibrado, muito elegante, de terno azul marinho, gravata, sapatos bons, cachecol chique no pescoço e chapéu de feltro. Começou o surto bem na minha frente numa rua de pedestres, com voz tronitoante:
- hay una pregunta que podemos hacernos, disse ele pausadamente, parando com uma mão na cintura e a outra num gesto largo. Algum gaiato entre ambulantes e transeuntes replicou:
- solo una, no, hay mutias!
Ignorando a intervenção continuou, com sua voz empostada, como um político na tribuna do senado:
- donde está el tesoro de Uruguay?
Aí, então, as respostas foram mais jocosas, do tipo comigo é que não está. As pessoas, mesmo passando, interagiam com o louco que discursava para uma platéia imaginária.
Como que saboreando o efeito de sua bombástica pergunta, adiantou-se alguns passos, e como se olhasse nos olhos de algum adversário, disparou com o dedo em riste:
- usted lo a sacado, su nazista. E avançando dirigiu-se a outros, yo lo se que ustedes sacaran milliones de dólares del banco de la Republica. Sacaram oro, milliares de barritas de oro. Ladrones.
A voz possante ecoava acusatória. Era uma voz denunciando ao vento.
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